A União adotou uma nova estratégia para tentar recuperar gastos do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) com acidentes de trabalho em que haveria culpa comprovada dos empregadores. Além das ações regressivas individuais, a Procuradoria-Geral Federal (PGF) passou a ingressar com processos coletivos. Em um só pedido, cobra vários benefícios concedidos a diferentes funcionários de uma mesma empresa. Os valores solicitados de indenização são milionários.
Já são três casos ajuizados pela PGF. No primeiro deles, que serviu como teste, o Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região condenou o frigorífico Doux Frangosul, processador de frango cujos ativos estão arrendados para a JBS, a pagar mais de R$ 1 milhão de indenização. O valor é referente a despesas com 111 auxílios-doença.
Os benefícios foram concedidos a empregados da empresa acometidos com doenças ocupacionais. Esses funcionários desempenhavam o cargo de abatedor. Segundo a PGF, os funcionários se submeteram a condições ergonomicamente inadequadas de trabalho.
As outras duas ações coletivas existentes foram ajuizadas no ano passado. Uma delas é contra a empresa de call center Contax em Pernambuco e busca indenização de R$ 1,3 milhão por 330 benefícios concedidos - que envolvem doenças ocupacionais e psíquicas.
A PGF também ajuizou ação coletiva contra a Agrícola Jandelle (do grupo JBS), no Paraná, com o pedido de devolução do que foi pago em 497 benefícios. O valor da causa é de cerca de R$ 3,5 milhões. Nos dois últimos processos ainda não houve julgamento.
Segundo o procurador-chefe da Divisão de Ações Regressivas da PGF, Nicolas Francesco Calheiros de Lima, mais três novas ações estão sendo preparadas. Para ele, essa estratégia deve ser mais eficaz para que empresas corrijam o que está causando os acidentes.
"As ações coletivas têm uma função pedagógica. Até porque os valores envolvidos fazem com que seja necessário o registro no balanço das companhias, o que pode chamar a atenção de acionistas, e assim, promover um incremento espontâneo nas políticas de cumprimento das normas de segurança do trabalho", afirma.
No caso da Doux Frangosul, única ação coletiva julgada, os desembargadores da 3ª Turma do TRF foram unânimes a favor da PGF. Para eles, ficou comprovada a negligência quanto às normas de proteção à saúde dos funcionários.
Segundo a decisão, as imagens feitas por diligência do Ministério do Trabalho e Emprego "demonstram o total desrespeito à saúde humana. Empregados em posições inadequadas efetuando movimentos repetidos em alta velocidade, assemelhando-se a verdadeiras máquinas de empilhar, degolar e embrulhar".
Já a ação contra a Contax foi desencadeada, segundo o procurador, após auditores fiscais do trabalho verificarem um "estímulo abusivo à competição e a exibição dos resultados individuais". Além de "pressão para aumento das vendas e cobrança de metas inalcançáveis e monitoramento contínuo e vigilância ostensiva do trabalhador", entre outros problemas. A procuradoria ainda pleiteia devolução de benefícios concedidos por lesões nos ombros de funcionários.
A ação contra a Agrícola Jandelle também abarcou benefícios por doenças físicas e psíquicas. Dentre as físicas, ferimento do punho e da mão. Segundo o procurador, "a empresa submetia os trabalhadores a condições nocivas à saúde, obrigando-os a trabalhar em ritmo intenso, sem proteção ergonômica, realizando movimentos repetitivos e posturas extremas".
O uso das ações coletivas, de acordo com o procurador, deve otimizar o trabalho da PGF. "Até pouco tempo, todo acidente causado geraria um PIP [Procedimento Interno Preparatório] e uma ação judicial para que se buscasse o ressarcimento, o que poderia demorar quatro ou cinco anos para discutir um benefício só. Agora podemos mapear quantos benefícios comuns [obtidos pelos mesmos motivos] foram concedidos para uma empresa e entrar com uma só ação."
Neste mês, um grupo com dez procuradores começou a trabalhar só com as ações coletivas. A equipe, segundo o procurador, deve atuar em conjunto com o Grupo de Atuação Especial em Ações Regressivas (Gae), composto pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), Advocacia-Geral da União (AGU) e PGF para elaborar estratégias nacionais conjuntas, em reuniões mensais sobre o tema.
Por Adriana Aguiar | De São Paulo