ISS Fixo: saiba quem tem direito

Os municípios estão impondo vários obstáculos ao recolhimento do ISS sob a forma fixa, com vistas a ampliar a sua arrecadação, por meio da cobrança do imposto variável, incidente sobre o faturamento da pessoa jurídica. Tais restrições vão desde a imposição da adoção da forma societária de sociedade civil até a exigência de que inexista no Contrato Social a previsão de pró-labore e da distribuição de lucros.

Essas exigências, porém, não são válidas e podem ser questionadas perante o Judiciário, pois não constam no art. 9º, § § 1º e 3º, do Decreto-Lei nº 406/68, norma geral que consagrou o ISS Fixo em âmbito nacional, tendo sido recepcionada pela Constituição Federal de 1988, segundo o entendimento pacificado pelo STF.

Conforme a norma, o ISS é devido em valor fixo quando caracterizada a prestação pessoal pelo contribuinte de serviços profissionais, de natureza intelectual, com responsabilidade própria. Ou seja, é necessária a ausência de caráter empresarial.

Tratando-se de uma norma geral nacional, prevalecem os requisitos previstos no art. 9º, § § 1º e 3º, do Decreto-Lei nº 406/68. A legislação dos Municípios não poderá restringir o direito ao ISS Fixo, sendo ilegítima a previsão de novos requisitos, sob pena de violação da hierarquia normativa.

Nesse contexto, destaca-se que a constituição da pessoa jurídica como LTDA. ou EIRELI não afasta, de plano, o direito ao ISS Fixo, diversamente do que pretendem os Municípios. Além de o Decreto-Lei nº 406/68 não exigir uma determinada forma societária, a modalidade de constituição não determina o caráter empresarial, com exceção da sociedade por ações (arts. 982 e 983 do Código Civil).

A qualificação da pessoa jurídica depende da sua substância, e não da sua forma. O que importa é a realidade dos fatos, a qual é traduzida pelo objeto social e pelo modo de atuação. Em matéria tributária, o aspecto meramente formal ou burocrático jamais pode preponderar sobre o conteúdo, em razão do princípio da verdade real ou material, que decorre da legalidade tributária.

Por isso, várias decisões judiciais já admitiram o direito ao ISS Fixo para as sociedades prestadoras de serviços profissionais constituídas sob a forma de LTDA., precedentes que se aplicam, por analogia, quando a modalidade adotada for a EIRELI.

Nesse ponto, é fundamental destacar que a limitação da responsabilidade em razão do tipo societário adotado é relativa apenas às obrigações sociais, como as trabalhistas e previdenciárias, não guardando qualquer relação com a responsabilidade pelos atos profissionais praticados. Responsabilidade societária e responsabilidade profissional não se confundem. E a responsabilidade pessoal exigida pelo Decreto-Lei nº 406/68 diz respeito à responsabilidade profissional.

Ocorre que a responsabilidade pelos atos praticados no exercício de profissão regulamentada é sempre pessoal e ilimitada, independentemente da forma jurídica adotada. Isso porque há disposições gerais de direito e específicas de cada profissão que impõem que, no caso de danos oriundos da má prestação dos serviços profissionais (dolo ou culpa), a responsabilidade do profissional atinge o seu patrimônio particular.

Assim como a forma jurídica, o pró-labore e a distribuição de lucros também são irrelevantes para o recolhimento do ISS Fixo, por não guardarem relação com o caráter empresarial.

A inexistência de caráter empresarial pressupõe a ausência de organização dos fatores de produção, isto é, uma estrutura simplificada. Contudo, a atividade prestada em tais condições obviamente terá como objetivo o lucro, como necessidade para a subsistência dos profissionais, que não são obrigados a atuar com fins assistenciais. A ausência de finalidade lucrativa é pressuposto apenas para determinadas imunidades e isenções, o que não é o caso.

O art. 997, inc. VII, do Código Civil estabelece que o Contrato Social da própria sociedade simples deverá prever a participação de cada sócio nos lucros e nas perdas, assim como ocorre na LTDA. Além disso, por força dos arts. 1.007 e 1.008 do mesmo diploma, toda e qualquer sociedade, independentemente de possuir caráter empresarial, deve repartir o resultado positivo ou negativo que obtiver. Qualquer cláusula do contrato que dispuser em sentido contrário é passível de nulidade.

Quanto ao pró-labore, consiste na remuneração do sócio administrador. Isto é, trata-se da contraprestação pelos serviços por ele prestados, traduzindo uma questão de Justiça.

Finalmente, os serviços profissionais, de cunho intelectual, via de regra, não têm natureza empresarial, conforme o art. 966, parágrafo único, do Código Civil. Assim, vige uma verdadeira presunção legal. Somente se o exercício da profissão constituir elemento de empresa, o que ocorre quando não consistir na atividade fim, é que existirá atuação de forma empresarial, circunstância que deve ser comprovada pela Fazenda Municipal.

A colaboração de auxiliares não descaracteriza a prestação pessoal, isto é, não determina o caráter empresarial, não configura o elemento de empresa, conforme já decidido pelo STJ.

Enfim, as pessoas jurídicas prestadoras de serviços profissionais, com a devida habilitação dos seus sócios nos órgãos fiscalizadores da profissão, possuem direito de pagar o ISS em valor fixo ainda que constituídas como LTDA. ou EIRELI. Esse direito – que pode ser buscado na via judicial – é assegurado também quando estão previstos no Contrato Social o pagamento de pró-labore e a distribuição de lucros.

Fernando Telini e Lucianne Coimbra Klein, advogados tributaristas da Telini Advogados Associados - www.telini.adv.br