É possível o aproveitamento de notas fiscais inidôneas pelo contribuinte de boa-fé

No primeiro semestre desse ano, o Superior Tribunal de Justiça definiu uma questão tributária objeto de longa controvérsia entre as Fazendas Estaduais e os contribuintes. Com a Súmula nº 509, ficou validado o aproveitamento pelo contribuinte de boa-fé dos créditos de ICMS oriundos de notas fiscais posteriormente declaradas inidôneas.

A boa-fé é presumida quando o ato de compra e venda tiver ocorrido antes da declaração de inidoneidade do fornecedor ou quando ausente publicação oficial sobre tal fato pela Fazenda Estadual.

O fornecedor declarado inidôneo após a compra e venda estava regularmente constituído no momento da transação comercial, possuindo inscrição perante os órgãos estaduais competentes. Não se pode atribuir má-fé ao adquirente quando este desconhecia a inidoneidade. É, portanto, indevida a glosa dos seus créditos, já que as autoridades fiscais não podem desconsiderar um negócio consumado e lícito.

No caso de haver ato declaratório de inidoneidade, mas ainda pendente de publicação oficial, também estará presente a boa-fé, pois o adquirente não tinha nem poderia ter ciência da situação do fornecedor. Ou seja, a publicação é requisito para que o referido ato produza efeitos contra os terceiros que negociarem com a empresa declarada inidônea. Aliás, a publicidade é elemento de eficácia dos atos administrativos, garantindo a segurança jurídica.

O Fisco não pode exigir que o contribuinte, ao adquirir as mercadorias, faça o levantamento da situação fiscal do fornecedor. Além de inviabilizar o exercício da atividade comercial, a exigência traduz ilegítima delegação da função fiscalizatória das autoridades fiscais. Ao adquirente cabe apenas verificar a regularidade da inscrição do fornecedor.

Para confirmar a presunção de boa-fé decorrente da aquisição prévia da mercadoria, é preciso comprovar a efetividade da compra e venda, isto é, a entrada física da mercadoria, o que pode ser feito por meio de registros contábeis e comprovantes de pagamento, dentre outros documentos.

O aproveitamento de créditos de ICMS é direito que decorre do princípio constitucional da não cumulatividade, obrigatório no âmbito deste imposto. Não pode, então, ser restringido pela legislação nem pelas autoridades fiscais.

Enfim, a glosa de créditos de ICMS em negócios com empresas inidôneas somente será válida quando comprovado o conluio entre adquirente e fornecedor, bem como nas operações realizadas após a publicação do ato declaratório de inidoneidade.

A boa-fé do adquirente deve ser prestigiada, servindo de fundamento para questionar a glosa de créditos de ICMS nas vias administrativa e judicial.

 
FERNANDO TELINI, advogado tributarista, OAB/SC 15.727, e LUCIANNE COIMBRA KLEIN, advogada tributarista, OAB/SC 22.376